Mulheres em Cargos de Gestão no Serviço Público: Desafios, Assédios e Expectativas de Gênero.

Brasília, 05 de dezembro de 2024.

Por: Iolanda Aparecida Freire de Oliveira

RESUMO – O artigo “Mulheres em Cargos de Gestão no Serviço Público: Desafios, Assédios e Expectativas de Gênero” aborda os desafios enfrentados por mulheres em posições de liderança na gestão pública brasileira. Apesar dos avanços em igualdade de gênero nas últimas décadas, as mulheres ainda enfrentam barreiras significativas, como preconceito, assédio sexual e moral, sobrecarga de responsabilidades devido à “dupla jornada” e expectativas sociais restritivas. 

O texto destaca as barreiras institucionais e culturais que limitam a ascensão feminina, bem como a insuficiência de políticas públicas para combater práticas discriminatórias. Além disso, analisa como as expectativas de gênero moldam a atuação das mulheres em cargos de liderança, exigindo delas uma postura equilibrada entre autoridade e empatia. 

Por fim, o artigo conclui que, embora as mulheres na gestão pública estejam promovendo mudanças significativas, é necessário fortalecer políticas de igualdade de gênero, implementar medidas efetivas contra o assédio e fomentar uma cultura organizacional mais inclusiva para garantir um ambiente respeitoso e equitativo. 

INTRODUÇÃO

Nas últimas décadas, a presença das mulheres no setor público e em cargos de gestão tem aumentado significativamente, refletindo as mudanças sociais e políticas que promovem a igualdade de gênero. No entanto, apesar de avanços importantes, as mulheres continuam a enfrentar barreiras significativas em sua ascensão a posições de liderança.

Desafios como o preconceito de gênero, a sobrecarga de responsabilidades, o assédio e as expectativas da sociedade em relação ao papel das mulheres nas esferas de poder ainda limitam a plena participação feminina na gestão pública. Este artigo discute os principais desafios que as mulheres enfrentam em cargos de gestão pública, o assédio que enfrentam e as expectativas de gênero que moldam suas trajetórias profissionais.

1.DESAFIOS DAS MULHERES EM CARGOS DE GESTÃO NO SERVIÇO PÚBLICO

Embora a participação feminina nos serviços públicos tenha crescido consideravelmente ao longo dos anos, as mulheres continuam com sub-representação em cargos de liderança nas instituições governamentais. A Constituição Federal de 1988, por exemplo, abriu caminhos para a promoção da igualdade de gênero, mas os resultados práticos ainda são tímidos quando se observa a presença de mulheres em cargos de gestão.

Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) indicam que, apesar de as mulheres representarem quase metade da força de trabalho no Brasil, elas ocupam menos de 30% dos cargos de alta gestão nas esferas municipais, estaduais e federais.

  • BARREIRAS INSTITUCIONAIS E CULTURAIS

Um dos principais desafios enfrentados pelas mulheres em cargos de gestão pública é a persistência de barreiras institucionais e culturais. Em muitos setores da administração pública, os cargos de liderança têm sido historicamente ocupados por homens, o que resulta em uma resistência à ascensão feminina. A cultura patriarcal ainda presente em grande parte das instituições públicas contribui para que as mulheres sejam vistas com desconfiança quando assumem papéis de poder.

Esse ambiente muitas vezes cria um espaço de trabalho em que a competência das mulheres é constantemente questionada, enquanto os homens são vistos como mais aptos a liderar, especialmente em contextos de tomada de decisão e gestão de crises. O preconceito de gênero, em que a mulher é associada a papéis de cuidado e apoio, gera um estigma de que a mulher não seria capaz de tomar decisões difíceis ou de liderar com a mesma eficácia que um homem.

  • SOBRECARGA DE RESPONSABILIDADES: A DUPLA JORNADA

Outro desafio significativo para as mulheres em cargos de gestão pública é a sobrecarga de responsabilidades. As mulheres, frequentemente, enfrentam a “dupla jornada”, ou seja, precisam conciliar as exigências de sua vida profissional com as responsabilidades familiares e domésticas. Embora os avanços no mercado de trabalho tenham permitido que mais mulheres alcancem cargos de liderança, a sociedade ainda exige delas o cumprimento dos papéis tradicionais de cuidadoras, mães e esposas.

Esse acúmulo de tarefas e a falta de políticas públicas eficientes de apoio à conciliação da vida familiar e profissional, como a ampliação de creches e a oferta de licenças parentais, dificultam a permanência e o sucesso das mulheres nas posições de liderança. Muitas mulheres têm que optar por uma dedicação exclusiva ao trabalho, sacrificando aspectos de sua vida pessoal, ou lidar com a frustração de não poder avançar na carreira por conta das responsabilidades domésticas. Isso gera um impacto direto sobre a sua saúde mental e física, além de prejudicar seu desempenho profissional e sua ascensão nas carreiras públicas.

  1. ASSÉDIO NAS INSTITUIÇÕES PÚBLICAS: DESAFIOS ADICIONAIS

2.1. O ASSÉDIO SEXUAL E MORAL NA GESTÃO PÚBLICA

O assédio sexual e moral infelizmente ainda é uma realidade enfrentada por muitas mulheres no ambiente de trabalho, incluindo nas instituições públicas. De acordo com a pesquisa da ONG “Mulheres do Brasil” (2020), cerca de 25% das mulheres no setor público já foram vítimas de assédio sexual ou moral. No contexto da gestão pública, esse tipo de comportamento é ainda mais comum devido ao desequilíbrio de poder entre os cargos de gestão e os subordinados, onde as mulheres em cargos de liderança são frequentemente assediadas por seus subordinados ou superiores.

O assédio sexual e moral no ambiente de trabalho pode se manifestar de diversas formas, como piadas de teor sexual, comentários desrespeitosos, toques indesejados, ameaças veladas e pressão psicológica para favorecimentos ou promoções. As mulheres que ocupam cargos de gestão muitas vezes têm dificuldades para denunciar esse comportamento, temendo represálias ou a perda de sua posição no órgão público. Além disso, a cultura organizacional machista em muitas instituições públicas tende a minimizar o impacto do assédio, tratando-o como algo corriqueiro ou até mesmo justificável.

2.2. A FALTA DE POLÍTICAS PÚBLICAS EFICIENTES DE COMBATE AO ASSÉDIO

Embora muitas instituições públicas possuam códigos de conduta e políticas para combater o assédio, a implementação de medidas eficazes ainda é insuficiente. A falta de treinamento adequado para gestores e servidores sobre como identificar e lidar com o assédio, assim como a ausência de canais de denúncia seguros, dificulta a erradicação desse problema. As mulheres, especialmente as que ocupam cargos de gestão, frequentemente ficam expostas a esse tipo de abuso sem o suporte institucional necessário para lidar com a situação.

A criação de espaços seguros, o treinamento contínuo sobre igualdade de gênero e a promoção de uma cultura organizacional mais inclusiva são fundamentais para reduzir o assédio nas instituições públicas e garantir que as mulheres possam trabalhar em um ambiente respeitoso e livre de discriminação.

  1. EXPECTATIVAS DE GÊNERO NAS MULHERES NA GESTÃO PÚBLICA

3.1. AS EXPECTATIVAS DA SOCIEDADE SOBRE AS MULHERES LÍDERES

A sociedade ainda tem expectativas diferentes em relação às mulheres em cargos de gestão pública, o que reflete um preconceito implícito sobre o papel feminino na política e no serviço público. As mulheres são frequentemente cobradas para serem mais empáticas, colaborativas e cuidadosas, características que são associadas ao gênero feminino, enquanto os homens são vistos como mais aptos a serem autoritários e firmes.

Essas expectativas podem gerar um grande conflito para as mulheres em cargos de gestão pública, pois elas precisam equilibrar a necessidade de demonstrar autoridade com a pressão para manter uma postura considerada “adequada” para o sexo feminino. Por um lado, elas são desafiadas a exercer liderança de maneira mais rígida, por outro, precisam atender às expectativas sociais de serem acessíveis, sensíveis e, muitas vezes, conciliadoras.

3.2. A TRANSFORMAÇÃO DAS EXPECTATIVAS DE GÊNERO NO SETOR PÚBLICO

As mulheres têm, por sua vez, uma expectativa de transformar as práticas e políticas públicas de maneira mais inclusiva. Em cargos de gestão pública, elas buscam implementar políticas que promovam a igualdade de gênero, o empoderamento feminino e a equidade no acesso a direitos e serviços. O fortalecimento da presença feminina na gestão pública pode levar à criação de políticas mais sensíveis às necessidades das mulheres e à valorização do trabalho feminino, além de contribuir para a redução das desigualdades sociais e econômicas.

CONCLUSÃO

A presença das mulheres em cargos de gestão na gestão pública é um reflexo de importantes avanços na luta pela igualdade de gênero. No entanto, elas ainda enfrentam desafios significativos, como a discriminação de gênero, o assédio sexual e moral, e a sobrecarga de responsabilidades, que dificultam sua ascensão e permanência em posições de liderança. As expectativas sociais em relação ao papel da mulher, somadas às barreiras institucionais e culturais, criam um cenário desafiador para as mulheres que desejam impactar positivamente o setor público. Para que haja uma verdadeira transformação, é essencial a implementação de políticas públicas que favoreçam a igualdade de gênero e o combate ao assédio, além da promoção de uma cultura organizacional mais inclusiva e respeitosa no setor público.

REFERÊNCIAS

– Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). “Mulheres e Mercado de Trabalho no Brasil”. 2020.

– Mulheres do Brasil. “Pesquisa sobre Mulheres no Setor Público”. 2020.

– Conselho Nacional de Justiça (CNJ). “Mulheres no Poder Judiciário: Desafios e Avanços”. 2021.

– Organização das Nações Unidas (ONU). “Relatório sobre Igualdade de Gênero na Gestão Pública”. 2022.

– Brasil, Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos. “Políticas Públicas de Gênero no Brasil”. 2021.

 

Currículo Acadêmico:

Iolanda Freire é Advogada, especialista em Direito Tributário e Trabalhista, Pós-graduada em Direito Tributário e Pós graduanda em Gestão Pública. Palestrante em empresas privadas e órgão públicos. Trabalhou por muitos anos nas áreas de Departamento Pessoal e Recursos Humanos. Membro das Comissões “Direito na Escola” e “OAB Solidária” da 11ª Subseção da OAB de Montes Claros-MG. Conciliadora certificada pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG). Também integra o Conselho de Acompanhamento e Controle Social (CACS-FUNDEB), contribuindo para a fiscalização e melhoria da gestão pública.