VIOLÊNCIA DOMÉSTICA, VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER – O QUE LEVA A MULHER SER VÍTIMA

Brasília, 05 de dezembro de 2024.

por – Tatiana Klock Martins Aguilar

Quando discutimos a Violência Contra a Mulher, sobretudo, a Violência Doméstica, não podemos deixar de falar sobre o que faz tantas mulheres a se submeterem longos períodos convivendo com seu algoz.

A Neurociência explica que independente da idade, nosso cérebro é programado para buscar pistas de segurança ou pista de perigo, herdamos isso dos primatas. A genética é responsável por 30% do “como” nós iremos funcionar. O que acontece no decorrer do nosso desenvolvimento, no meio em que somos expostos, liga ou desliga essa genética, podendo até modificá-la. Através da plasticidade cerebral, nosso cérebro é moldado pelas experiências internas (desde do ventre) ou externas (influências do meio ), o cérebro conta uma história para si mesmo.

A partir dessa primícia, podemos começar a entender os comportamentos na vida adulta. Toda mulher que está sofrendo algum tipo de violência, ela não escolhe sofrer, ela não gosta de sofrer. Certamente, essa mulher “aprendeu” de forma equivocada um modelo que a faz se deixar ser machucada, seja através da agressão física, psicológica, moral, sexual ou patrimonial. Quando atendemos uma mulher vítima de violência, avaliamos como essa mulher passou a sua infância, qual modelo de mundo ela tem. Buscamos entender em qual ambiente ela passou sua vida, se era um ambiente tóxico ou não, se teve carinhos dos genitores, amparo, se passou por ameaças sociais, castigos, agressões na primeira infância e na adolescência, se foi vítima de abusos sexuais, privação de contato materno, pais ausentes ou abandono. Toda essa somatória certamente impacta na vida adulta, em como essa mulher expressa as emoções e sentimentos, e o quanto ela se deixa ferir e como ela se reconhece.

Uma criança que passou a sua infância em um ambiente de ameaças, privações e abusos, tais como: gritos, palavras mal ditas “chorar abre os pulmões”, “você só sabe chorar” “eu bato porque te amo” “eu só te bato porque você merece”, e tantos outros… essa criança cresce construindo um modelo mental, um padrão mental de que o amor fere, dói, machuca e que não há mal nisso, ela se identifica com esse padrão, justamente porque as pessoas a quem deveriam cuidar, amar e proteger, são as que a ferem e machucam.

A Violência contra Mulher não pode ser tratada com superficialidade, Violência contra Mulher é um problema de saúde mental. Todas as medidas serão ineficazes se não tratarmos a raiz do problema. Na grande maioria, a raiz do problema está em como essa mulher aprendeu a interpretar a vida. Desde a nossa concepção, recebemos diversos estímulos que vão sendo codificado e formam nossa representação interna, nosso “mapa” da realidade. Existe uma enorme diferença entre o mundo e nossa experiência dele. Cada um de nós cria a sua própria representação do mundo e se comporta de acordo com esse modelo, lembrando que esse comportamento não chegou na vida adulta, ele foi moldado e modelado na infância. Quanto menos estressores ambientais e genéticos, mais esse cérebro terá condições de se desenvolver de forma saudável, tendo uma boa saúde mental.

A criança vive todas as emoções de forma: sentir e externalizar, porém, nem todas as crianças se comportam assim, isso irá depender da forma que ela aprendeu, a forma de como o “ambiente” a ensinou. Se ela aprendeu que não pode chorar, reclamar e até mesmo ficar feliz, essa criança muito cedo começa a ter sintomas de suprimir essa emoção, ou seja, ela não aprendeu a regular as emoções, que de fato, deveria ser ensinada por adultos, em tese seus genitores.

É na infância e adolescência que os sinais e sintomas de traumas não tratados aparecem, mas nem sempre validados. As emoções reprimidas, extravasam em forma de dor e compulsões, que logo consequentemente anestesiadas pelas “anestesias emocionais”. Nosso cérebro precisa de uma recompensa e para isso ele busca anestesias para fugir da dor, essas anestesias têm a ver com as nossas dores emocionais e essas anestesias estão: nas compulsões, nos hábitos de adquirir dopamina, nas brigas e na raiva, na limpeza em excesso, nas preocupações constantes, nas patologias e no ciclo da dor. É preciso permitir que as emoções aconteçam.

O desamparo aprendido é uma das diversas punições contra a nossa biologia emocional. A criança desamparada e não validada em suas emoções, ela certamente irá passar por processos de repetições até a vida adulta, ou até que seja tratada emocionalmente.

Diante dos fatos, podemos entender o “porquê” de todos os dias assistirmos notícias de Violência contra a Mulher, o motivo de tantas mulheres permitirem ter a sua subjetividade sequestrada, ao ponto de quando estão longe de seu cativeiro, sentir falta dele.

O sequestro da subjetividade é uma forma de aliciamento, uma invasão suave e processual. Antes dos maus-tratos do cativeiro, há a sedução da conquista. A dependência afetiva emocional, passa pelas mesmas regras da dependência química. A primeira experiência com drogas costuma ser prazerosa, o contexto é a afabilidade. O traficante, nunca aborda violentamente o seu futuro dependente, ele o seduz. Depois de firmada a dependência, o que se vê é a intolerância, a relação desumana. Com o estreitamento da relação, o que se percebe é o estabelecimento de um estado semelhante ao que se dá no sequestro do corpo: a condição de vítima. O outro exige o que não é direito exigir, ultrapassa os limites que deveriam ser preservados e pisa a dignidade. Nesse processo de dependência, o algoz afasta a vítima de tudo o que para representa segurança. Quanto maior insegurança, maior seu domínio. Essas seduções que resultam em tragédias, infelizmente tem se tornado cada dia mais comum em nossa sociedade, mulheres se tornam incapazes de romper com as forças que as destroem, perdem o amor-próprio, desamparam-se aos poucos até perderem o senso de direção, perdem a posse de si mesmas. Ser pessoa é ter a posse de si, de acordo com a Antropologia Cristã, o conceito de pessoa deve ser compreendido a partir de dois pilares: ser pessoa consiste em dispor de si para depois estar disponível . Mas para que isso aconteça, a mulher precisa se livrar das amarras de dor, dos modelos existentes em seu constituinte.

É necessário superar as idealizações, elas são perigosas. No ato de imaginar, construímos a pessoa ideal, mas pessoas ideais só existem nas ideias. Nós sabemos quem somos. Os outros imaginam. Os outros sabem quem são. Nós os imaginamos…

 

Concluo afirmando que toda violência começa na infância, a criança maltratada, mal- amada, não acolhida, cresceu e se tornou vítima, aprisionada em uma visão distorcida do amor e dela mesma. Acostumada a viver sem sua garantia de direitos, sem sua escuta especializada e sem alma. Pessoas são como casas, possuem históricos que necessitam ser respeitados. Não podemos tratar o adulto sem antes conhecer a sua criança interior. Freud afirma que todos carregamos uma criança e que a parte inconsciente da mente carrega comportamentos e padrões de vida adquiridos na infância. Toda mulher que passa ou passou por violência, precisa ser vista pela sociedade como uma pessoa que precisa de cuidados e atenção, precisa ser curada de inúmeras feridas, para se capacitar e receber de fato a sua identidade. Isso não fala sobre qualificação profissional, sobre posição social ou poder econômico, é um crime que começou na infância. O corpo que sofre a violência é a prova concreta do desrespeito. Nele há evidências que houve uma invasão de território, um crime.

Não podemos combater a Violência Contra a Mulher com medidas de afastamento apenas, medidas protetivas, precisamos tirar essa mulher da dor e dar-lhe a sua verdadeira identidade. Da mesma forma não podemos trancar o algoz na prisão e depois dar-lhe a liberdade sem antes entender, que, ali também existe uma criança não validada, mal- amada e que sofreu dores.

Em 1 Corintíos 13:4 diz : “ O amor é paciente e bondoso. O amor não é ciumento, nem presunçoso. Não é orgulhoso, nem grosseiro. Não é irritável, nem rancoroso”…

Curriculo:
Tatiana Klock Martins Aguilar NeuroPsicanalista e Palestrante
Especialista em Mulheres e sua Estrutura Psíquica Especialista em Clínica dos Transtornos
Especialista Clínica em Crianças e Adolescentes com ênfase em Depressão e Ansiedade
Especialista Clínica no Universo Emocional Masculino
Especialista em Análise e Interpretação e Diagnóstico do Desenho Infantil
Embaixadora no Rio de Janeiro Esepas Contra Abuso Sexual da Criança e Adolescente
Facilitadora Educacional do Desenvolvimento Humano Especialista em Desenvolvimento Infantil
Praticcioner PNL Programação Neurolinguística
Coordenadora Terapêutica do Instituto Incluir e Conscientizar Educadora Emocional e Sexual
Educadora Parental Educadora Inclusiva